Poéticas oceânicas para vidas em terra firme

Acho que foi através dos olhos de minha mãe que vi o mar pela primeira vez. Ela viveu no litoral paulista muitos anos antes de eu nascer, mas sempre tive a certeza de que algo da imensidão azul que ela tanto contemplava se instaurou em mim no momento da concepção, já na Capital.

Acho que foi através dos olhos de minha mãe que vi o mar pela primeira vez. Ela viveu no litoral paulista muitos anos antes de eu nascer, mas sempre tive a certeza de que algo da imensidão azul que ela tanto contemplava se instaurou em mim no momento da concepção, já na Capital. O resultado foi que nasci mais ou menos oceânica, com o mar desaguando em meu imaginário, e talvez por isso, ao me deparar com um dossiê inspirado na “PEC das Praias”, minha subjetivação primeira tenha me indicado, como rota de pesquisa, o caminho das águas.

Vasculhar o Repositório Institucional (RI UFSCar) em busca de trabalhos que dialogassem com essa temática trouxe um misto de sensações. A partir de palavras-chave como “mar”, “oceano” e “praia” cheguei a quatro trabalhos que discutem problemas tão duros como é a própria PEC, porém, diferentemente dela, o fazem a partir de materialidades sensíveis e belas, tão belas como o fino traço que separa o céu do oceano, nomeado por Eduardo Galeano como “utopia”.

Para o poeta uruguaio a utopia era como a linha do horizonte, esquivando-se sempre à frente conforme o deslocamento daquele que a vê e impulsionando um eterno caminhar. É no mínimo curioso, mas principalmente cruel, que para os primeiros navegadores transatlânticos tenha sido esse mesmo horizonte a utopia a ser, mais do que avistada, alcançada, esquadrinhada, capturada, dominada. Na ânsia por “conquistá-la”, o modelo por eles inaugurado redesenhou a história dos povos e suas relações entre si e com as águas salgadas que circundam os continentes, primeiro através da colonização e da consequente destruição material e imaterial de territórios, seus habitantes e modos de vida, depois através da escravização de parte das pessoas que ali viviam e de sua exportação “além mar” como modelo de negócio. É sobre esse segundo efeito que um desses quatro trabalhos, a tese de doutorado de Juana Maricel Sañudo Caicedo, se debruça.

Conheça este e os outros três trabalhos resenhados lendo o texto completo, disponível em pdf a partir deste link